6 de maio de 2006

«Enquanto tiver cabeça, tempo e possibilidade, vai haver Abrupto»

No terceiro aniversário do Abrupto, recuperamos um recente artigo-fetiche dos nossos arquivos, 5 factos sobre o Abrupto (na verdade, são 20). Existe pouco que se possa dizer acerca do Abrupto que já não tenha sido dito (e citado aqui) nestes últimos três anos, mas vêm à memória estas palavras de JMF, no Terras do Nunca, sobre o funcionamento do Abrupto «como um pólo aglutinador, mesmo daqueles que nunca por lá passaram, mesmo daqueles que fingem que nunca por lá passam». No nosso caso, basta dizer que é o blog que mais visitamos e o que mais vezes citámos neste blog.
Adiando a reflexão, para passar directamente à citação, deixamos algumas frases soltas da intervenção de José Pacheco Pereira, na Livraria Almedina, em Dezembro, num dos únicos encontros de bloggers em que pudemos estar presentes (escusado será referir que a emoção do dia foi ver a Carla Hilário Quevedo em pessoa). Foi uma rara oportunidade para ouvir o autor que diz estar "virado para o mundo exterior" falar sobre o mundo dos blogues e o seu próprio lugar nele.

Os soundbytes da intervenção de JPP, depois do salto.


Não sinto nenhuma obrigação de cumprir qualquer agenda.

O programa do Abrupto tem-se mantido igual desde o início e é aquele no qual eu me reconheceria com 14, 15 anos.

O Abrupto depende de uma agenda que é eminentemente não-política.

O Abrupto tem um arranjo deliberadamente simples e despojado, que desde o primeiro dia só sofreu duas alterações. (...) O estilo traduz uma identidade do autor e também do leitor (que reagiria às mudanças).

Não tem notas sobre estados de alma, porque ninguém tem nada a ver com isso. No máximo, pode se dizer que revela aspectos sobre o autor através do discurso de outras coisas.

É um blog voltado para o exterior e não para o mundo dos blogues, e esta é uma opção deliberada.

Recebo uma média de 140 e-mails por dia.

Não me interessa muito o "discurso interior". É uma auto-referência que não me atrai. O Abrupto é um blog "solitário".

Leio muitos blogues, mas o que está lá fora é mais interessante. Tenho curiosidade pelo mundo, pela Astronomia (que sofre de reducionismo dos jornalistas).

Interessa-me saber qual é a resposta do Abrupto. Não "leio" as audiências.

Sobre o "Pobre País", pensei "estou a pôr isto e estou a ver que é adeus ao emprego". Decidi no mesmo momento colocar.

Tento diminuir a agenda política no Abrupto, porque para isso já tenho outros instrumentos. Não quero que a política seja a linha dominante de um blogue que corresponde mais a um projecto pessoal e muito antigo de vida.

Sou sensível à opinião dos meus leitores.

O Abrupto é um blog de grande coerência, feito das coisas de que eu gosto e que são sempre biográficas. É por isso que criou leitores fiéis.

Tenho mais visitantes dos EUA do que da Europa. Recebo inclusivamente visitas do Teerão, e que não são por engano.

Manter um blogue tem sido uma experiência interessante e fascinante. Enquanto tiver cabeça, tempo e possibilidade, vai haver Abrupto.

Quando comecei [o nome Abrupto] pareceu-me certo, eficaz e isso mais a frase de Sá de Miranda foram coisas que eu já tinha guardadas comigo há muito tempo.

Não tenho qualquer sentido de obrigação em actualizar o blogue. Não tem regras. Apenas esforço-me para que os Early Morning não apareçam à tarde. Apesar disso, há sempre as corruptelas ocasionais.

A agenda dos blogues não se sobrepõe à agenda dos jornais. Os blogues são um instrumento sobretudo para outro tipo de coisas, como os diários.

A leitura temporal dos blogues é o elemento predominante e condicionante da escrita. Empurra o passado para baixo.

A blogosfera tem algumas vantagens em relação aos média. Tem tempo, memória e pode ter especialização.

Os jornais não são blogues e os blogues não são jornais, mas há um terreno comunicacional comum que pode complementar um e outro (a memória, efabulação, etc).

O meu espaço de comentário na SIC era uma aproximação da agenda do Abrupto. (...) Era a sombra do Marcelo, com a diferença que não consigo falar de um livro sem o ler.

Qualquer crítica feita no Abrupto é imediatamente respondida. Há sempre uma resposta. Há aqui um instrtumento de poder, porque uma carta publicada no Abrupto é garantia de acção. É por isso que tenho muita prudência [na selecção dos comentários dos leitores].

Sou um bruto afectivo.

Irrita-me a crítica que sou um autor mediático. É uma sina.

O azedume nos blogues é o azedume da vida mal-vivida.

O que é efectivamente novo é o alargamento do espaço público a novas formas de intersubjectividade, de criação estética e o tipo de relações que essas fórmulas têm com o mundo lá fora.

Ter um blog é uma experiência de liberdade idêntica a um jornal clandestino. Os blogues vieram permitir novos tipos de interacção com coisas muito antigas.

As literacias são a chave da riqueza do futuro e não o acesso às tecnologias.

Não tenho nenhuma intenção de o acabar [o Abrupto].


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